ARTIGOS
Mestres Bruxos
O que o aprendiz espera de um mestre? Qual a missão de um mestre?
Precisamos de um mestre? Que riscos corremos sem ele? Existe o mestre
embusteiro, o falso mestre? Que riscos corremos nas mãos dele?
Mestres bruxos costumam ser idealizados por aprendizes como seres
sobre-humanos, fontes inesgotáveis de proteção e sabedoria, espíritos
que emanam bem estar e segurança com sua simples presença física, seres
que demonstram seus dons incomuns e seu domínio sobre técnicas que fogem
completamente ao alcance da ciência. Os aprendizes geralmente esperam
dominar o que seu mestre domina, despertar em si seus dons maravilhosos e
conseguir sua sabedoria. Se acham no caminho de aprender a bruxaria mas
se colocam na posição de ovelhas suplicantes por um pastor que lhes
dirija. A maioria não vai ao encontro do mestre buscando por
esclarecimentos, ao contrário, ficam no aguardo de comandos, instruções,
e acreditam que, se lhes seguirem as palavras, um dia o mestre
reconhecerá seus esforços e lhe dará em um toque o domínio sobre os
elementos, os sentimentos, a mente e, quiçá, o espírito.
Não poderiam estar mais enganados. Em primeiro lugar, iluminados ou não,
mestres são pessoas sábias, mas como encarnados, vivem os mesmos dramas
diários de qualquer um. Sua missão não é passar o conhecimento sagrado,
isso pode ocorrer como pano de fundo, mas o que os mestres realmente
buscam é fazer com que o aprendiz aprenda a caminhar sozinho. Ao
contrário do que muitos pensam, a maior prova de sucesso de um mestre é
ser superado por seus iniciados. Mas as glórias, assim como as derrotas,
dependem muito pouco do mestre. Cabe ao aprendiz aprender; ao mestre,
orientar. Digo e repito, sem cansar, que a caminhada é sempre solitária,
que o aprendiz, por mais que esteja sendo orientado, tem de caminhar
sozinho para aprender. Um mestre que leva o aprendiz sobre os ombros não
está atuando como um mestre, não está ensinando o aprendiz a caminhar.
Mas é sensato prescindir de um mestre e caminhar sozinho desde o início?
Mestres são dispensáveis, mas se não o tivermos, corremos riscos que não
precisaríamos correr. Quem tenta acessar alguma área reservada do site
da Ordem Sagrada de Bennu é direcionado para uma página com a imagem de
uma caveira sobre um caldeirão sob o qual está escrito: "Cuidado,
bruxaria sem mestre gera risco de doenças, loucura e morte." Isso não é
uma brincadeira, é um aviso, pois o risco é verdadeiro. Estranho que os
livros de bruxaria alertem tão pouco sobre isso quando o assunto é uma
constante em livros de alta magia e de teosofia. Ao despertar em si
processos desconhecidos, a transformação pode não ser bem o que se
esperava; além de o mestre poder evitar armadilhas em que caímos no
processo de aprendizagem, algo não previsto nos livros aos quais a
pessoa tem acesso pode acontecer, e nestes casos, a quem o aprendiz vai
recorrer se não tiver um mestre?
Uma criança não deixará de chegar à idade adulta por ser órfã desde
cedo, mas isto não significa que crescer sem pais seja uma opção
preferível.
A confusão não termina aí. Muitas pessoas que se acham 100%
independentes, que se consideram bruxas solitárias, não se dão conta de
que adotam mestres temporários quando assistem a palestras, participam
de rituais abertos, de eventos pagãos, de comunidades bruxas, de
dinâmicas ou vivências esotéricas. E aí pululam falsos mestres,
embusteiros que, bem ou mal intencionados, só ampliam o risco, vampiros
de toda a espécie e crianças que expõem a si e aos outros a situações
perigosas.
Um mestre não é alguém a quem se deva "obediência", é alguém que nos
ensina, alguém que ouvimos com atenção, alguém em quem acreditamos e,
pelos menos em algum aspecto, admiramos. Não estabelecer um vínculo
iniciático com ninguém não é sinônimo de não ter mestres. Então,
escolham bem seus mestres, mesmo quando optar por não se afiliar a
nenhuma linhagem bruxa. Afinal, é mais fácil encontrar embusteiros
posando de mestres em rituais públicos do que fechados em coventículos; o
sábios não são dados a pavonices, preferem qualidade a quantidade, não
precisam nem querem provar nem a si mesmos nem a ninguém que são bons,
querem apenas ser úteis.
Então existem falsos mestres?
De um certo ponto de vista, sim. Poderíamos, talvez, chamar de falsos
mestres aqueles que não têm sabedoria, aqueles que atuam visando o
benefício pessoal, mesmo quando tal benefício seja apenas a promoção
pública, mesmo quando não busquem nada além de afagos egóicos ou
reconhecimento de méritos inexistentes.
Mas por que ainda resta dúvida se devemos chamá-los de falsos mestres?
Porque mesmo que eles não tenham jamais aprendido aquilo que pretendem
ensinar, aqueles que se acercam de embusteiros o fazem porque precisam,
na fase em que estão, de duras lições, lições que aprenderão da pior
forma possível, sendo enganados, explorados e vampirizados.
Quando acordarem do pesadelo, ainda que levem muitas vidas para acordar,
poderão identificar com muitíssimo mais clareza o que é sábio e o que é
estúpido, e seguirão lépidos a favor da correnteza.
Crianças ganham anti-corpos ao lidarem com a sujeira; aprendizes ganham clareza mental ao lidarem com embusteiros.